Comemorar São João? Vale conhecê-lo

Comemorar São João? Vale conhecê-lo




Dia 24 de junho, segunda-feira próxima, muitos brasileiros se reúnem em torno de barraquinhas, fogueira, bandeirinhas, quadrilha, quentão e pau-de-sebo para celebrar São João. Hoje, darei às mãos aos ensinamentos do Padre Paulo Ricardo, para pular a fogueira do que não sabemos junto com o querido leitor. Ao final, os quitutes tendem a ser melhor saboreados, quando celebramos São João com mais consciência. 

Santo Agostinho nota que João Batista é o único santo cujo nascimento a Igreja celebra além do [Natal] do próprio Salvador, uma vez que a festa da Natividade de Nossa Senhora ainda não fora instituída à época. Essa tradição é observada para cumprir as palavras do anjo Gabriel ao pai de João, Zacarias: “Com seu nascimento muitos se alegrarão” (Lc 1, 14), que são lidas na Vigília [da festa], no dia que a antecede.

Tem-se observado com frequência que os dias do ano começam a ficar mais curtos logo após a Natividade de João Batista, que acontece três dias após o solstício de verão, e começam a ficar mais longos logo após o Natal do Senhor, quatro dias após o solstício de inverno [no hemisfério norte, evidentemente]. Isso simboliza as palavras com que São João “resumiu todo o Evangelho em uma única frase: ‘É preciso que ele cresça, e eu diminua’ (Jo 3, 30)”. [Longe de perder-se no hemisfério sul, a simbologia aqui só se inverte: até o Natal de Cristo, os dias vão ficando maiores — é Cristo a luz que cresce; até a Natividade de São João Batista, os dias vão ficando menores — é a luz do Batista que diminui.]

S. João, discípulo de Cristo, era oriundo de uma família socialmente bem colocada (cf. Mc 1, 20; Jo 18, 15). Foi primeiro discípulo do Batista; começou depois a observar os ensinamentos de Cristo (cf. Jo 1, 35-40), embora não se tenha associado de imediato ao grupo de seguidores do Mestre. Foi só mais tarde, após ser chamado por Ele juntamente com seu irmão Tiago e com os irmãos Pedro e André, que João abandonou de vez a pesca e a família para estar exclusivamente com Jesus (cf. Mt 4, 21; Mc 1, 19; Lc 5, 1-11). 

Que João era de índole enérgica e contundente, assim como seu irmão Tiago, fica claro no episódio em que ambos pretenderam rogar a Deus que caísse fogo do céu sobre uns samaritanos que se haviam recusado a receber Jesus. Foi nesta ocasião que, segundo muitos exegetas, o Senhor lhes impôs (cf. Mc 3, 17) o nome Boanerges, que significa “filhos do trovão”. Além do que, é de todos sabido que João foi um dos discípulos mais queridos de Cristo, como atestam inúmeras passagens evangélicas (cf., por exemplo, Mc 5, 37; 9, 1; 14, 33; Jo 13, 23.35 etc.) e, sobretudo, aquele sinal eloquente de amor e predileção com que o Redentor, pouco antes de expirar, encomendou-lhe o cuidado de sua própria Mãe (cf. Jo 19, 26s). 

Após a ressurreição de Cristo, ele está com frequência ao lado de S. Pedro, como sócio e companheiro de pregação (cf. Jo 18, 15; 20, 2-8; 21, 1ss; At 3, 1ss; 4, 3ss; 8, 14). É também enumerado por S. Paulo, ao lado de Tiago e do Príncipe dos Apóstolos, como uma das colunas da Igreja (cf. Gl 2, 9). No Livro do Apocalipse, ele diz de si mesmo: “Eu, João, vosso irmão e companheiro nas tribulações, na realeza e na paciência em união com Jesus, estava na ilha de Patmos por causa da Palavra de Deus e do testemunho de Jesus” (Ap 1, 9). 

São João morreu por volta do ano 100, na ilha de Éfeso, como atestam inúmeros autores antigos, como S. Irineu, S. Polícrates, S. Justino Mártir, Apolônio, adversário dos montanistas, Clemente de Alexandria, entre outros.

Escrito na Ásia nos últimos anos do séc. I, o seu evangelho tem por finalidade: a) pregar com clareza a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, b) impugnar uma série de heresias (o gnosticismo de Cerinto, o ebionismo etc.) que já naquela época começavam a deturpar a sã doutrina e desviar os cristãos da única fé verdadeira e c) complementar, tanto histórica como teologicamente, os três evangelhos sinóticos. 

O prólogo do quarto evangelho, que durante vários séculos a Igreja usou para ler ao final da Missa, revela-nos a altura teológica a que a graça divina elevou o olhar de S. João: “No princípio”, escreve ele, movido pelo Espírito Santo, “era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus” (Jo 1, 1). Antes de que tudo fosse feito, já havia na Palavra eterna do Pai, que Ele gera desde toda a eternidade, sem sucessão nem diferença de perfeição, a razão de todas as coisas, todo o plano da criação e da redenção futura do gênero humano. NO VERBO ETERNO, POR QUEM TUDO FOI FEITO E SEM O QUAL NADA PODE SUBSISTIR (CF. JO 1, 2), JÁ EXISTIA A IDEIA DE CADA HOMEM QUE VIRIA A ESTE MUNDO. Nele está a nossa verdade, isto é, aquilo que desde todo o sempre Deus “sonhou” para nós; nele está todo o nosso bem, porque é nele “que temos a vida, o movimento e o ser” (At 17, 28), de forma que, quanto mais nos afastamos dele, mais nos aproximamos da morte, da imobilidade e, por fim, do não-ser. 

Que, pela intercessão de S. João, Apóstolo e Evangelista, possamos hoje acolher na fé a verdade de que só em Cristo Jesus tem sentido e consistência a nossa existência neste mundo, porque só Ele, que é antes de todos os tempos, pode fazer resplandecer dentro de nós a luz da vida verdadeira (cf. Jo 1, 4.9).