História da Barragem do Benfica – Parte I, por Guaracy de Castro Nogueira

História da Barragem do Benfica – Parte I,  por Guaracy de Castro Nogueira

Em novembro de 2003, o historiador Guaracy de Castro Nogueira publicou um estudo brilhante sobre a história da Barragem do Benfica, em parceria com a Folha do Povo. Agora usamos seus dados, como base da reprodução que fazemos usando nossas próprias palavras, a fim de relembrar com admiração e saudades esse legado deixado pelo líder itaunense, meu vovô Guará, detentor de uma visão de futuro inigualável e de um conhecimento imortal sobre nossa querida Itaúna.

Em um momento histórico de vibrante mobilização cívica, o ilustre e saudoso médico Dr. Antônio Augusto de Lima Coutinho foi eleito prefeito de Itaúna, obtendo expressivos 3.497 votos em uma eleição que, após um hiato de 17 anos, devolveu ao povo o poder de escolha. O Dr. Coutinho exerceu o cargo de prefeito de 15 de dezembro de 1947 até 31 de janeiro de 1951.Sua vitória foi conquistada por meio de uma robusta coligação política, que contava com o apoio do Dr. Tomaz Moreira de Andrade como vice-prefeito. A coordenação da chapa esteve sob a responsabilidade do antigo Partido Social Democrático (PSD), unindo forças com o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), o Partido de Representação Popular (PRP) e o Partido Republicano (PR). Essa união partidária se destacou como uma força imbatível nas urnas.

Os candidatos foram registrados sob a bandeira do PTB, uma vez que o PSD local, alinhado à “ala liberal”, enfrentava dissidências em nível estadual. De outro lado, a União Democrática Nacional (UDN), respaldada pelos governos estadual e municipal, apresentava duas boas opções: Cândido Perillo para prefeito e Joaquim Nogueira Penido para vice-prefeito, mas, apesar de seus esforços, arrecadou apenas 2.197 votos, enquanto a coligação vitoriosa conquistou não apenas a prefeitura, mas também a eleição de sete vereadores, em contraste com os quatro da UDN. Em 1948, enfrentou um desafio inesperado com a devastadora enchente do rio São João, que causou significativos estragos à comunidade. Dr. Coutinho, diante da gravidade da situação, declarou o município em estado de calamidade pública e dirigiu um memorial ao Presidente da República, solicitando ações urgentes para mitigar os problemas relacionados às inundações. A resposta veio com a visita do Dr. Camilo Menezes, diretor geral do Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS), que veio a Itaúna, realizou estudos detalhados e informou ao Ministro da Viação e Obras Públicas, General Joan Voldetero de Amorim e Mello, que a solução passava pela construção de um reservatório no rio São João, a montante da cidade, visando controlar as enchentes e aumentar o potencial hidroelétrico da região.

Ainda segundo o Dr. Camilo, os estudos necessários seriam realizados com o patrocínio da Companhia Industrial Itaunense, a prestadora de força e luz do município, que se mostrava extremamente interessada na resolução do problema. José de Cerqueira Lima, presidente do PSD e fiador da eleição do Dr. Coutinho, comprometeu-se a tomar as devidas providências para um serviço que exigiria um longo período de pesquisa minuciosa, abrangendo desde a localização de possíveis lagos até o levantamento topográfico detalhado da área, com curvas de nível que garantissem a segurança e economia da barragem a ser construída.

Em busca de atender às exigências da nova constituição estadual, o prefeito Coutinho, aliado ao seu compadre, o notável político Pedro Aleixo, então secretário do Interior e Justiça, buscou, por meio do novo Departamento de Assistência aos Municípios (DAM), a elaboração de um Plano de Obras que visasse promover a recuperação e o desenvolvimento da cidade. A determinação e a visão de Dr. Coutinho em tempos de adversidade consolidaram seu legado na história de Itaúna, deixando, sem dúvidas, marcas indeléveis na comunidade que, por tantas gerações, é profundamente grata a sua liderança.

O governo estadual desenhou a planta baixa do grandioso plano, alicerçado em um meticuloso levantamento topográfico realizado pela Prefeitura. Nessa sinfonia de colaboração, o Dr. Osmário Soares Nogueira, com o respaldo da Companhia Imobiliária Construtora Belo Horizonte (CICOBE), indicou uma firma de renome, capaz de conduzir o estudo do sistema viário que, como um rio de progresso, prometia transformar a fisionomia da cidade. As ideias fluíam em cristalinas, entrelaçando a construção de pontes, o escoamento de águas pluviais, a canalização de esgotos e um abastecimento de água que se tornaria a veia pulsante da comunidade.

No entanto, ao chegar ao manche da cidade o novo prefeito, Vítor Gonçalves de Souza, empossado em 1° de fevereiro de 1951, encontrou-se diante de imensos desafios. O plano, que já ressoava como um cântico de esperanças, via-se paralisado por duas razões contundentes. A primeira barreira: a falta de verba que impossibilitava o pagamento dos honorários da firma especializada, uma sombra que obscurecia o horizonte em um momento em que a voracidade do progresso clamava por ação. A segunda razão, ainda mais crucial, era a premência da construção da grande barragem. Sem ela, o sonho de revitalizar a parte baixa da cidade, historicamente vulnerável às inundações, não poderia se concretizar.

Neste cenário, a urbanização ganhava contornos grandiosos, com a tão esperada canalização do rio. A ideia da avenida perimetral, que abraçaria a várzea, surgia como um véu de renovação em meio ao caos. Uma dezena de pontes se erigiria majestosa, tecendo novos caminhos e acessos ao coração pulsante do município — a entrada ao centro, projetada com esmero sob a ponte da estrada de ferro, e a abertura da avenida que hoje conhecemos como Avenida Jove Soares. Este era o legado do Dr. Coutinho, um plano diretor que sonhava com a transformação, onde as águas da esperança se encontrariam com as margens da realidade.

Assim, os ecos do passado e as promessas do futuro se encontraram numa correnteza de desafios e oportunidades. Estava lançada a pedra angular para que, um dia, esse sonho de urbanização e resiliência se tornasse uma gloriosa realidade.