Mãe

Mãe
Brígida Gonçalves*


“Eu vim do corpo da minha mãe

Ela me deu semente boa

Nutre meu corpo

Se espalha em bençãos

Sou plantadeira de semente boa”

(Isadora Canto, Plantadeira)

Sinônimo de amor, cuidado, doação e lugar seguro. Relação conturbada, cheia de desafios, padrões impostos e inalcançáveis, inseguranças e medos.

Mãe, que significa a mulher que deu à luz, que cria ou criou um ou mais filhos. Mãe, em seu sentido etimológico, que vem do latim “mater”, ou também “mamma”, que significa “seio”, e “mammare”, que significa “mamar”, associando ao ato íntimo de alimentar a sua prole. Mas que, hoje, depois de inúmeras transformações e mudanças na sociedade, sabemos que é muito mais que isso. Mães que geram, mães que adotam e outros familiares que assumem a função materna...

Ano passado, em 2023, o Dia das Mães foi atípico. Acordei cedo para acompanhar uma querida amiga em seu momento mais doloroso: despedir-se de sua mãe, que faleceu jovem, vítima de uma enfermidade, bem no Dia das Mães. Sinto admiração por sua força e amor por quem ela tem se tornado desde então.

Neste ano, em 2024, me vejo em uma outra situação, que não achei que fosse presenciar pelo menos nos próximos anos: acompanhar de perto a dor e o luto da minha querida avó, que perdeu um de seus quatro filhos, de forma precoce e sem explicações, e que, pela primeira vez, celebrará a sua data com uma cadeira vazia e uma dor que nunca terá cura.

E acompanho, mesmo que de longe e dentro dos meus privilégios de estar segura em meu estado, os filhos, filhas e mães no Rio Grande do Sul, que passarão a data sem saber se a sua família está em segurança. 

Não falo como mãe, já que não sou, mas como filha. Filha de uma mulher que assumiu a responsabilidade de três bebês muito jovem, sem experiências, sem recursos financeiros e emocionais, buscando melhores condições através do estudo. Teve a sorte de ter seu companheiro ao seu lado, mas ainda era pouco. Sozinha e jovem em Belo Horizonte, quando mais precisava ser cuidada como filha do que cuidar como mãe. 

Crescemos com a figura materna, ser que nos alimenta (de diferentes formas) e nos protege de todo mal e é só isso que queremos e exigimos. Durante a infância, a enxergamos unicamente em sua função de mãe, sem defeitos, sendo quase que exclusivamente nossa única figura de inspiração. São com elas que aprendemos quem queremos ser, imitamos padrões e nos espelhamos. 

Graças à maturidade e ao crescimento pessoal, isso muda. Crescemos e a magia é quebrada. Passamos a enxergar seus defeitos, suas dificuldades, seus desejos para além de sua função como mãe, mas, sim, como mulher. E, na maioria das vezes, podemos nos decepcionar. É decepcionante ver que aquela pessoa que você achava que era um ser sem defeito, quase que heroico, é recheada deles. Não concordamos com algumas escolhas e atitudes, com visões de mundo e maneiras de ser, e, na maioria das vezes, vamos em busca da nossa liberdade e autonomia. Aprendemos a nos espelhar em outras pessoas e seguimos o nosso caminho. Acredito que todos passaremos por isso e, hoje, depois de alguns encantamentos e decepções, enxergo minha mãe como ela foi e como é: humana.

Caso um dia eu me torne mãe, minha mãe seguirá como o meu maior exemplo. Apesar de todas as adversidades da vida, problemas e situações difíceis, deu o seu melhor para os seus três filhos, com responsabilidade, doação e coragem. Sim, ser mãe é um ato heroico.

* Jornalista pela Universidade 

Estadual de Minas Gerais (UEMG)