O ataque à imprensa como estratégia política

O ataque à imprensa como estratégia política
*Sérgio Cunha

A estratégia de usar da agressividade, de tentar tornar um fato paralelo, destaque, para abafar outro, continua sendo arma política de algumas pessoas Brasil afora. E quando somada esta estratégia ao ataque à imprensa aí, imaginam, se torna mais eficiente a estratégia, visto que ganha espaço na mídia e “abafa” aquele outro assunto retirando-o do debate. E nada mais que isto foi o que se pode extrair da ação do vereador Guilherme Rocha, na Câmara de Itaúna, ao atacar o jornalista Renilton Pacheco, como ocorreu nesta semana. O fato a ser “abafado” é a necessidade ou não de se alugar um carro de luxo para utilização dos vereadores, em suas viagens. Como o jornal editado pelo jornalista, questionou o fato, ao abordar a necessidade ou não de se alugar o veículo, mesmo a Câmara já tendo a seu serviço outros três carros, repercutiu na cidade, gerando insatisfação dos cidadãos-eleitores. Aí, tentaram dizer que já existia carro alugado, que a imprensa ‘demorou’ a fazer a denúncia, etecétera e tal. E para completar a questão, partiu o vereador citado para cima do jornalista, acusando-o de “tomar café, comer o lanche, dos vereadores”, ocupar espaço no plenário... E amplia as acusações, agressivamente afirmando que os jornalistas, a imprensa itaunense, são ‘preguiçosos’.

O edil, agindo assim, quer tirar o foco da questão central, que é a necessidade ou não de se alugar um carro de luxo para os vereadores “irem a Brasília”. Então, é preciso abordar o assunto, por partes. 

Vamos à primeira delas, que é a mais importante: é necessário um carro de luxo – ou até mesmo os três carros já existentes? Para alguns vereadores, como foi apontado, não é necessário, nem o carro de luxo e, até os outros três. E esse negócio de “eu não uso, mas meus assessores usam” é ‘conversa fiada’. Se “meus assessores” usam, “eu uso!” É mais honesto dizer assim, não acham? Portanto, é preciso saber que os cidadãos-eleitores itaunenses não aprovaram, em sua maioria, essa questão de alugar carro ‘de luxo’ para a Câmara. Haja visto a repercussão da matéria.

Dois. Dizer que fica mais barato ir a Brasília, de carro, é relativo. Pesquisando na internet, encontra-se valor em torno de R$ 700, ida e volta. Com os deslocamentos até o aeroporto e mais algumas despesas, vamos colocar R$ 1,2. Aí, vai de carro de Itaúna a Brasília, são 1.014 km, ida e mais 1.014 km da volta. Só de combustível, em torno de R$ 800, mais 20 horas de estrada, ida e volta, diária do motorista, alimentação, pedágios... Será que realmente fica mais barato? Isso sem falar que precisa contabilizar aí o aluguel do veículo, e uma série de outras despesas adjacentes.

Três. “Preguiça” da imprensa porque “só agora” divulgou? Então não devia ter divulgado, porque não detectou o problema na hora, quando o carro foi alugado “lá na administração passada?” Então a fiscalização tem que ser seletiva? Se não foi detectado o problema antes, não pode divulgar agora? Se os outros, os anteriores estavam errados – e na opinião de quem discorda, do aluguel deste carro, estavam – os atuais não estão? Não se trata de ser Nesval, Toinzinho, Câmara passada, Câmara atual. O que se questiona é: precisa de alugar “carro de luxo” para a Câmara? Lembrando aqui o ex-prefeito de Boa Esperança, no Sul de Minas que ao ser questionado por quê usava um Fiat Uno no seu gabinete, ele chamou o cidadão até a porta da Prefeitura, apontou uma loja próxima e disse: “aquele carro que está lá na porta, é o carro da minha família, onde a minha mulher e a minha filha, andam. É um Fiat Uno, que foi o que eu consegui comprar com o meu dinheiro. Por que quando é com o dinheiro do povo, eu tenho que gastar com luxo?” Aí cabe a pergunta: cada vereador de Itaúna tem um carro, seu, adquirido com o seu salário, igual ou melhor do que um Corolla, para transportar a sua família? 

Quatro. ‘Preguiça’ 2. Se a imprensa é preguiçosa porque ‘só agora’ questionou o aluguel do carro, o que são os vereadores, fiscais natos, que deveriam cobrar, no mínimo, comedimento e transparência quando se usa o dinheiro público? São o que, mesmo? Até porque eles, os 17 do mandato passado e os 17 do atual mandato, deveriam fiscalizar essa e outras questões, e nem sempre o fazem... 

Cinco. A acessibilidade que o jornalista tem ao plenário, incomoda o vereador, só agora? O RI da Câmara só passou a proibir esse acesso agora, que é preciso encontrar um tema para ‘abafar’ a questão do aluguel do carro? Uai, pelo entendimento dele mesmo, neste caso não estaria sendo ‘preguiçoso?’

Seis. O jornalista tomar café, comer um salgadinho ‘dos vereadores’ – comprado com dinheiro público, não se esqueça – está incomodando? Ou é coisa pequena, mas que serve para criar meme, galhofa, para distrair a atenção do assunto principal que é a necessidade ou não de ‘alugar carro de luxo para servir aos vereadores’?

Sete. Se o segurança não tirar, “eu mesmo vou tirar!” Machão o cara, pode até gerar uma quebra de decoro, por aí, não é? São os descaminhos da política... Mas, voltando à questão principal, o importante é que o questionamento permanece: é necessário o aluguel de um carro de luxo para a Câmara?

* Jornalista profissional, especialista em 

comunicação pública e membro da Academia 

Itaunense de Letras – AILE, sendo titular da cadeira 26.