Processo seletivo viciado(?)

Edital dispensa experiência de trabalho realizado na Prefeitura e contabiliza período que não era exigido

Processo seletivo viciado(?)
Foto: Reprodução/Montagem


Uma série de “enganos” registrados em um processo seletivo da Prefeitura, o de número 02/2024, que prevê a contratação de profissionais para a área da saúde, vem sendo motivo de muitas reclamações. Até mesmo uma audiência pública para tratar do assunto foi realizada na Câmara. Várias pessoas que participaram do referido processo apontam incoerências e o que chamam de “dois pesos e duas medidas” no momento de definir a classificação dos candidatos. Além disso, é constante a reclamação da opção por processos seletivos simplificados em detrimento da realização de concursos públicos na Prefeitura. Esta opção da administração pelo “processo seletivo simplificado”, inclusive, seria um dos motivos de o quadro de pessoal da Prefeitura apontar, como mostrava o Portal da Transparência no dia 22 de maio, “4.387 servidores públicos ativos” e apenas 965 deles na condição de efetivos.

No citado processo seletivo simplificado, foram oferecidas vagas para Assistente Administrativo de Saúde; Assistente de Gestão; Auxiliar de Gestão; Auxiliar de Saúde Bucal; Técnico de Enfermagem; Técnico de Enfermagem em Saúde Mental; Cirurgião Dentista EPNE, ECMF e EP; e Odontólogo. Os problemas começam já na classificação para o primeiro cargo. No edital, o cargo de Assistente Administrativo de Saúde informa que “não necessita experiência” e que o grau de ensino é o “Fundamental”. Porém, para a classificação, foi analisada a questão da experiência. Segundo comentários internos de servidores, o fator beneficia uma das concorrentes, pelo menos. Mas a principal contestação é a de que, se no edital não cobra experiência para este cargo, não há como aceitar o fator experiência como diferenciador classificatório. 

Curiosamente, os itens 5.1, 5.2 e 5.3 mostram que, inicialmente, “não é necessário experiência”. No segundo item, a afirmação é de que o desempate se daria, primeiramente, pela experiência apresentada. No item seguinte, a afirmação é de que a experiência deveria ser apresentada no ato da inscrição. Assim, o item 5.3 anularia o que se afirma no item 5.1 do referido edital. E, por ser uma nomenclatura criada a partir deste concurso, como se deu esta experiência? Ainda consta, no Anexo I do edital, outra incoerência, que é a necessidade de conhecimentos básicos em informática, que não está sendo cobrado no corpo do edital.

Experiência na Prefeitura não vale para o processo da Prefeitura...

No caso das candidaturas ao cargo de Técnico de Enfermagem, mais uma série de problemas são apontados. Inicialmente é preciso esclarecer que até 2022 não existia o cargo de Técnico de Enfermagem na estrutura da Prefeitura, mas apenas de Auxiliar de Enfermagem. Esta denominação foi acrescida a partir da Lei Complementar 191, de 154 de dezembro de 2022, portanto há pouco mais de um ano, criando 56 vagas para o cargo. Dessa forma, mesmo exercendo a mesma função, os profissionais com mais tempo de serviço eram denominados auxiliares e não técnicos.

Porém essa experiência registrada em carteira não foi aceita como comprovação da experiência pelos membros da comissão de avaliação do processo, com a alegação de que estaria o registro em “Carteira de Trabalho Digital”, ou que o cargo exercido não estava descrito como sendo de “técnico”, mas de “auxiliar”. Nem mesmo a apre-sentação de documentos comprovando que o Conselho Regional de Enfermagem - COREN reconhece as funções como similares, ou mesmo as descrições dos cargos de Auxiliar e de Técnico de Enfermagem da Prefeitura, que são idênticas, convenceu os membros da comissão.

Edital “não cobra experiência como Técnico de Enfermagem”

Profissional do Direito consultado pela reportagem afirmou que o item que descreve os critérios para a participação do processo não é claro, e “não cobra experiência como Técnico de Enfermagem”. E repete o texto: “Na especificação das condições está que é necessário 06 (seis) meses de experiência mínima. Ensino médio comple-to ou certificado de técnico de enfermagem (...). Se não é cobrado nem mesmo o cer-tificado de formação como técnico em enfermagem, não se específica ‘06 meses de experiência mínima como técnico...’, por que este endurecimento na questão da no-menclatura no momento de reconhecer a experiência? E digo nomenclatura, porque tanto as funções de técnico como de auxiliar de enfermagem, são as mesmas, na estrutura de cargos da Prefeitura”, disse. 

Comissão com maioria e comissionados

Outro questionamento feito em relação ao excesso de processos seletivos simpli-ficados, com a consequente falta de concursos públicos, é o critério na nomea-ção das comissões responsáveis por esses processos. Na maioria das vezes, co-mo no caso em tela, indicam maioria de ocupantes de cargos comissionados. Conforme a observação de juristas, nestes casos a opção deveria ser pela nome-ação de funcionários efetivos, que não estariam suscetíveis a pressões que po-dem ocorrer nos casos de comissionados. 

Nesta comissão, por exemplo, dos cinco componentes, dois são efetivos e os de-mais comissionados. “Esse fato pode facilitar situações que não são as ideais. Um ocupante de cargo comissionado pode sofrer pressão em caso de não atender a uma diretriz que pode levar a uma possível irregularidade”, comentou o profissi-onal do Direito ouvido pela reportagem. A opinião é de que o processo seja anula-do, que seja refeito com regras claras e objetivas, mas que, principalmente, sejam realizados concursos públicos.