Toda criança merece um campeão; minha deferência aos professores

Toda criança merece um campeão;  minha deferência aos professores


As crianças não aprendem por causa da pobreza, baixa frequência e influências negativas. Isso não é informação inédita. Nem para pais, nem para professores, nem para autoridades formuladoras de políticas públicas. Mas algo que raramente discutimos é o valor e a importância do contato pessoal, a importância dos relacionamentos. James Pierpont Comer é um respeitado professor de Psiquiatria Infantil, no Yale Child Study Center, desde 1976. Ele diz que nenhum aprendizado significativo acontece sem um relacionamento significativo. George Washington Carver, mestre e cientista que revolucionou a Botânica, registou que todo o aprendizado é entender os relacionamentos. Nenhum de nós que aprendeu alguma coisa nesta vida passou sem ser inspirado por um professor com quem nos relacionamos ou um adulto, que enxergamos como modelo e convivemos. Apresento, neste texto, com orgulho, a transcrição do relato tocante da mestra norte-americana Rita Pierson, professora de crianças.

Por muitos anos, Rita observou pessoas ensinando. Viu os melhores e viu alguns dos piores. Uma colega a disse, certa vez, “Eles não me pagam para gostar das crianças. Me pagam para ensinar a lição. As crianças devem aprender. Eu devo ensinar. Eles precisam aprender. Caso encerrado”. Ela respondeu: “Sabe, crianças não aprendem com pessoas de que elas não gostam”. Stephen Covey, professor de administração em Harvard, ensina que precisamos apostar em poucas coisas simples, como buscar entender primeiro. Antes de querermos ser entendidos. Isso vale até para coisas simples como pedir desculpas. Peça desculpas a uma criança e ela fica em choque. A mestra Piersen conta que, certa vez, foi ensinar uma matéria sobre proporções. Matemática não era seu forte. Ela se preparou para a aula, mas percebeu que tinha ensinado toda a matéria errada. Então, ela voltou para a aula no outro dia e se desculpou com os pequenos. Eles responderam: “Tudo bem, Sra. Pierson. Você estava tão animada, nós só a deixamos continuar”. 

Ela também conta que teve turmas que eram tão lentas, com tantas deficiências acadêmicas que chegou a chorar. Era terrivelmente pesado para ela. Como aumentar a autoestima de uma criança e seu desempenho acadêmico ao mesmo tempo? Ela teve uma ideia. Disse aos alunos: “Vocês foram escolhidos para estar na minha sala porque eu sou a melhor professora e vocês são os melhores alunos, eles nos colocaram juntos para que a gente mostre para todos os outros como se faz”. Notando a surpresa dos pequenos, complementou: “Precisamos mostrar para as outras turmas como se faz, então quando andarmos pelo corredor, as pessoas vão nos notar, vocês precisam ficar quietos. Só precisam se exibir”. Ela concluiu com um discurso que dizia: “Eu sou alguém. Eu era alguém quando eu entrei. Eu vou ser uma pessoa melhor quando eu sair. Eu sou poderosa e eu sou forte. Eu mereço a educação que eu recebo aqui. Eu tenho coisas para fazer, pessoas para impressionar e lugares para ir”. E eles todos responderam em coro concordando, animados. Próximo passo: ela passou um questionário de 20 questões. Um aluno que errou 18 recebeu a anotação “+2 e uma carinha feliz”. Sem entender o motivo da felicidade com a nota, o aluno escutou da professora como ele estava progredindo e se demonstrou entusiasmado em ir ainda mais longe. Ela ensina: “-18” tira toda a vida da criança. “+2” diz, “Você não está tão ruim assim”.

A mestra Rita Pierson também teve sua inspiração. Durante muitos anos, viu a mãe providenciar uma toalha, um sabonete e comida para as crianças que não cheiravam bem. Anos depois, a mãe aposentada, Rita assistiu a algumas dessas crianças retornarem para agradecer: “Você sabe, Sra. Walker, você fez diferença na minha vida. Você fez as coisas funcionarem para mim. Você fez eu me sentir como alguém importante, quando eu sabia, no fundo, que eu não era. E eu quero apenas que você veja o que eu me tornei”. Rita conta sobre o tanto de ex-alunos no funeral de sua mãe. Ela diz que não chorava porque a mãe tinha partido já idosa. Mas porque ela deixou um legado de relacionamentos que nunca poderia desaparecer.

É impossível que o professor infantil goste de absolutamente todos os alunos. E os difíceis aparecem por uma razão. Existem afinidades e relacionamentos. Mas mesmo que você não goste de todos, a chave é que eles nunca poderão saber disso. Então os professores se tornam grandes atores e grandes atrizes. São profissionais que devem ir ao trabalho mesmo quando não têm vontade e ouvir políticas educacionais que não fazem sentido. Mas, ainda assim, continuam ensinando da mesma forma. É isso que fazem. Ensinar e aprender deveria trazer alegria. Que poder teria o nosso mundo se tivéssemos crianças sem medo de assumir riscos, sem medo de pensar, e que tivessem um campeão para admirar? Toda criança merece um campeão para admirar, um adulto que nunca irá desistir deles, que entende o poder da conexão e insiste para que elas se tornem o melhor que elas podem ser. Esse trabalho é difícil? A mestra Rita responde sem titubear: “Pode apostar. Ah Deus, pode apostar que sim. Mas não é impossível. Nós podemos fazer isso. Nós somos educadores. Nós nascemos para fazer a diferença”.