Um Legislativo capenga e desnorteado

Na terça-feira, dia 15, como faço há mais de 40 anos, fui para o prédio da Câmara Municipal para acompanhar mais uma reunião ordinária do Legislativo, que seria conduzida ou presidida pelo vereador Gustavo Dornas Barbosa, vice-presidente da Casa de Leis, em substituição ao vereador Antônio de Miranda, presidente, que está com problemas de saúde, internado em Divinópolis. A reunião começou bem, mas acabou literalmente “descambando” por causa de uma publicação nossa na edição da semana passada e que envolve o aluguel de um carro de luxo pela presidência da Câmara, para atender os vereadores em viagens a Brasília e Belo Horizonte. Pelo menos essa foi a justificativa que ouvi por várias vezes.
A nossa publicação, que teve a manchete “Câmara aluga carro por R$ 6.287,50/mês”, foi na edição de número 1630, do dia 12 de abril, sábado passado. A repercussão foi grande e os vereadores ficaram agitados e preocupados com isso. O que é natural. Porém o vice-presidente, ou presidente ad hoc, ou ainda provisório, da Câmara Municipal, Gustavo Barbosa, com pouca habilidade, acabou por transformar o assunto em uma polêmica ainda maior, e a reunião virou bagunça, inclusive, envolvendo o jornal e eu, que sou o diretor/editor responsável por esta FOLHA, que é do Povo e é avaliada por esse povo — e tem a credibilidade desse mesmo povo, e tendo, segundo o Google Analytics, 173 mil seguidores e média de 60 mil acessos semanais.
O senhor Gustavo Barbosa, homem sério e correto, mas sem habilidade política nenhuma, não se conteve e tentou deixar o jornal mentiroso, afirmando em plenário que a reportagem estava equivocada ou errada, e que já havia convocado os servidores da Casa para explicarem a contratação do veículo de luxo, um Corola, para a próxima reunião na terça-feira, dia 22 de abril. Infelizmente, não me contive, e nem podia, pois tenho a segurança de que nossa reportagem está correta e centrada no extrato da licitação, publicado no Jornal Oficial do Legislativo e reproduzido por nós na reportagem. O presidente da Casa, com base num parecer da assessoria jurídica ou do setor de licitações, enviou no nosso WhatsApp um parágrafo do contrato onde está explicitado, na cláusula segunda, do valor do contrato, que este teria o valor anual de R$ 75.450,00, sendo que R$ 55.200,00 se refere à franquia contratada; R$ 5.250,00 à cota de quilômetros; e R$ 15.000,00 de estimativa de coparticipação obrigatória em caso de sinistro, roubo, furto, perda total, incêndio e multas de trânsito. Ou seja: seguro.
E aí, depois desse argumento apresentado, não tive alternativa a não ser contestar os posicionamentos, chegando ao cúmulo de interferir na reunião, atitude que tive pela segunda vez, nesses 40 anos de acompanhamento das sessões do Legislativo, como repórter, jornalista ou apenas cidadão. Não posso aceitar tamanho desrespeito para com o jornalismo, com o profissionalismo da imprensa na sua função de informar o leitor com seriedade e isenção. A imprensa não vai informar com viés político, como os pareceres funcionais e/ou de assessorias jurídicas compostas politicamente. Ela vai informar com fundamentação em dados, documentos e extratos, como é o caso em tela. Reproduzimos o extrato da licitação, que totaliza R$ 75.450,00 para 12 meses de aluguel. Então R$ 75 mil e 450 reais, divididos por 12 meses, dá R$ 6.286,50/mês. E não há argumentos contra isso. E, juridicamente, os R$ 15.000,00 destinados ao seguro e os R$ 5.250,00 da quilometragem estão inclusos no valor empenhado. Então não há como contestar.
Porém, ainda que insistam na contestação da matéria publicada com a apresentação de explicações técnicas/políticas, afirmamos que, além da questão valor do contrato, que é absurdo — e, se comparado com o anterior, é mais ainda —, a questão é moral e ética. Qual a necessidade de um carro de luxo para atender a presidência da Casa e os vereadores? A justificativa de viagens a Brasília para mim não serve, pois, se o vereador quer ir “buscar” verbas e emendas, que vá com o dinheiro do seu salário e no seu carro. É minha opinião. Fica a pergunta: por que mais um carro se a Câmara já possui quatro carros em bom estado de conservação? Pelo que sei, o número de vereadores não aumentou. E aí vêm outras perguntas: a Câmara precisa de um Toyota Corolla? Não seria muita ostentação ter um carro de luxo e no modelo contratado? Será que os carros já alugados não atendem à demanda?
E, assim, com uma discussão sem fim e que tumultuou a reunião da semana, e que contou ainda com um bate-boca entre a presidência ad hoc e pelo menos dois vereadores, também por causa de utilização dos veículos oficiais para viagem... Fica, depois disso tudo, pelo menos uma esperança de que o contrato do Corolla, no valor de R$ 6.286,50/mês, seja suspenso e/ou cancelado quando o presidente Antônio de Miranda reassumir o cargo, após recuperação, pois, sem coragem para assumir o que determina o Regimento Interno — que é claro em seu Art. 15: A Mesa Diretora, composta pelo Presidente, Vice-Presidente e Secretária, terá substituição nesta ordem, em caso de faltas e impedimentos, é incumbida da administração do Poder Legislativo Municipal —, Gustavo Barbosa apenas sugeriu a suspensão na manhã da quarta-feira, dia 16.
Assim, é lamentável que uma legislatura inicie deste jeito, com atos desnecessários e postura antiética. Num lugar onde deveriam estar se preocupando com leis maiores, fiscalização e discussão de temas que possam melhorar a cidade para o cidadão, estão discutindo e defendendo o valor de um contrato de aluguel de carro. Deveriam estar discutindo sobre ética e leis, e não valor de aluguel de carro de luxo para atender a Casa.
É importante aqui o registro de que entrevistamos 14 dos 17 vereadores sobre o contrato, com a seguinte pergunta: O que você acha de a Câmara contratar um carro de luxo para servir à presidência e aos vereadores? As respostas foram, na maioria, contrárias à contratação. Dois ou três ficaram “em cima do muro”, e dois foram favoráveis à contratação. E todos os entrevistados alegaram para a reportagem da FOLHA que não sabiam da contratação e que ficaram sabendo pelo jornal. O que achamos estranho, pois todos deveriam acompanhar as publicações do Jornal Oficial do Legislativo. E, mais que isso, deveriam estar atentos aos gastos da administração da Casa.
Quanto às explicações da assessoria da Câmara, que tenta “fracionar” o contrato para que o custo mensal fique em R$ 4.600,00, afirmamos que é uma desculpa para “enganar bobo”, pois a cota quilômetro será excedida sempre, e o seguro compartilhado não tem como ser excluído do montante. Então, diante de tudo a que assisti na terça-feira, uma bagunça generalizada e inexplicável, o que posso afirmar é que temos um Legislativo capenga e desnorteado. E olha que o nível dos vereadores nesta legislatura melhorou um pouquinho... Meu Deus!